Surpreendentemente, ter sucesso na aviação agrícola não é tanto uma questão de se pilotar bem o avião, embora esta seja uma grande prioridade. Na verdade, o principal fator desse sucesso é ser capaz de tomar decisões seguras e efetivas ao se lidar com a miríade de problemas que um piloto agrícola enfrenta a cada voo.
Para isto, tem uma frase que lembro que um veterano disse e que permanece na minha mente, depois de muitos anos. Se você não sabe, não faça. Se você não tem certeza que sua aplicação será segura e efetiva, é hora de abrir as portas do hangar e encerrar o dia. O conhecimento é um dos fundamentos básicos do voo seguro em qualquer lugar, particularmente no voo a baixa altura da aviação agrícola, e quanto mais você sabe, mais seguro você estará. Por outro lado, não saber algo pode resultar em um problema de forma muito rápida.
Quando você lê relatórios finais de acidente, deve perceber que muitos de nós passamos por experiências similares às daqueles acidentes, e escapamos por pouco de estar nesses relatórios, aparentemente por sorte. Os seguintes exemplos destacam algumas situações onde o conhecimento salvou minha pele, e uma falta de conhecimento poderia ter resultado em um dia ruim no escritório.
Não Tente o Impossível
Me lembro de uma ordem de serviço que me passaram enquanto carregavam o avião, detalhando uma lavoura triangular de seis hectares, cercada por pinheiros altos em todos os lados e com uma rede elétrica passando no meio. Minha primeira reação foi pensar que era uma brincadeira da equipe de terra. Mas meu técnico disse que não, e que o lavoureiro tinha dito para ele que ela tinha recebido aplicação aérea no ano anterior.
É claro que eu não estava acreditando. Eu estava voando um Air Tractor 401 na época, e educadamente me recusei a fazer a área, dizendo em tom de brincadeira que eu a faria à noitinha, com um pulverizador costal, dado que eu achava que nem nosso pulverizador terrestre conseguiria entrar lá, com suas barras de 30 metros.
Depois da última aplicação do dia, perguntei para dois outros pilotos da empresa sobre aquela área. Ela realmente tinha sido tratada pelo ar no ano anterior, mas por um helicóptero. Mesmo com a capacidade de manobra de um helicóptero, eu ainda preferiria que ela fosse pulverizada por um equipamento terrestre.
Não Acredite em Tudo que Você Escuta
Faz parte do trabalho de voar agrícola ter de operar de pistas improvisadas, muitas vezes longe da sede da empresa. Isso traz uma série de fatores desconhecidos, incluindo a configuração da pista, altitude densidade, riscos para a operação agrícola, procedimentos de operação padrão e daí por diante.
Descobri que um dos maiores fatores desconhecidos é a própria pista agrícola. Seu comprimento, sua largura e como é sua superfície. Me recordo de receber um chamado para ir para uma pista agrícola a cerca de 80 Km da sede. Liguei para o lavoureiro antes e pedi informações da pista. “Ela é leste-oeste, com 1.000 metros de comprimento, 15 metros de largura e com uma grama lisinha, uso ela há anos”, disse o lavoureiro. “Você vai gostar”.
Era de se pensar que essa descrição seria suficiente, e acreditei no que o lavoreiro disse. Grande erro da minha parte! Ao chegar na pista, algumas coisas imediatamente chamaram a minha atenção. Primeiro a grama estava com uns 30 centímetros de altura. Segundo pode ser que a pista tivesse 1000 metros, mas no meio dela estava passando um fio d’água, aparentemente precisando ser avaliado de perto para ver se era um risco ou não. E os 15 metros de largura? Suponho que tinha mesmo, Só que apenas os 6 metros da linha central eram planos, o restante eram dois perigosos declives laterais.
Por sorte, havia uma estrada reta de chão batido perto da pista do lavoureiro, com 12 metros de largura e 3.200 metros de comprimento, sem obstáculos. Mais do que suficiente para deixar este cowboy feliz.
Para esclarecer, o lavoureiro tinha um Piper Cub que ele operava naquela pista, e era esse o padrão que ele usava para avaliar a pista. Depois disso, quando me passavam uma nova pista, eu antes de decolar perguntava para o lavoureiro se dava para dois caminhões se cruzarem em direções opostas em cima dela, a 80 km por hora; se ele dissesse que sim, então a pista deveria ser boa.
Indicador de Estresse
Em qualquer máquina, vários indicadores ajudam o operador a manter o equipamento dentro de parâmetros seguros. Temperaturas, pressões, RPM, etc. Todos estes são criticamente importantes para operações seguras. Sobre isso, tive a experiência de transladar um Thrush motorizado com turbina Garrett, do local da venda para seu novo proprietário. Na época, eu não tinha familiaridade com turbinas Garrett, especialmente a exigência do uso de uma chave de enriquecimento de combustível para ajudar na aceleração do motor durante a partida. O uso daquela chave depende do monitoramento do indicador de RPM da turbina.
O problema era que o indicador de RPM da turbina estava inoperante. O vendedor se mostrou surpreso, e como “quebra galho”, sugeriu que eu escutasse o motor durante a partida, e quando percebesse que a rotação da turbina estava parando de subir, acionasse a tecla de enriquecimento de combustível. Ele demonstrou uma partida de motor bem sucedida fazendo exatamente isso.
As turbinas Garrett são muito sensíveis ao excesso de temperatura na partida, e me senti muito desconfortável com a perspectiva de operar aquele motor daquela forma, dada a minha pouca experiência com ele. A dica do veterano, “se você não sabe, não faça”, me livrou do risco de queimar uma turbina. Insisti, e felizmente um indicador de RPM de reposição foi encontrado e logo instalado.
Falando em indicadores, eu queria que alguém inventasse um indicador pessoal de estresse, que mostrasse claramente se um piloto está cansado ou estressado demais para voar com segurança. Enquanto esperamos que a comunidade médica crie esse “estressômetro”, teremos de confiar no que nos ensinam sobre como avaliar e lidar com o excesso de estresse.
Para começar lembre-se que a manutenção preventiva do piloto é como a do avião. Lidar com as coisas antes que elas quebrem é melhor e mais barato do que lidar com um acidente ou incidente. Se você não tem certeza quanto ao tempo, o avião ou seu bem-estar físico e mental, lembre-se da dica do veterano.
Se você não sabe, não faça.