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Forçando Sua Sorte – Como apostar na Meteorologia pode ser Fatal

Qual é a experiência mais assustadora que você já teve em um avião? Para mim, quase todas estas histórias envolvem mau tempo. Ainda que todas as minhas apostas na meteorologia tenham dado certo, elas ainda estão gravadas na minha memória como momentos nos quais minha vida, e em minha experiência, as vidas de outros estiveram no fio da navalha. Estes “finais felizes” estão entre os momentos mais críticos da minha experiência de voo. Esse é um dos motivos pelos quais sempre tive um interesse particular em acidentes relacionados com meteorologia e na observação das tendências de suas ocorrências ao longo do tempo. Já escrevi vários artigos sobre o assunto ao longo dos anos, e meu processo para escrevê-los sempre envolveu a leitura de vários relatórios finais da National Transportation Safety Board (NTSB, o órgão do governo americano que investiga acidentes de todos os meios de transporte, especialmente o aéreo) sobre acidentes relacionados com mau tempo. A revisão de relatórios individuais me dá uma sensibilidade para detalhes que não são facilmente discerníveis em uma mera estatística. Uma tendência que notei estar em declínio, em uma recente revisão de dados, é o número de pilotos sem CHT de voo por instrumentos que estavam preenchendo e voando com planos de voo IFR. Vamos dar uma olhada nos números.

Pelos números

Para este artigo, revisei dados de acidentes ocorridos entre 2017 e 2021. Foram encontrados 177 acidentes, dos quais 83% fatais, com a perda de 321 vidas. A ocorrência oscilou entre 30 a 40 acidentes por ano, com o maior número em 2017 (40) e o menor em 2018 (29). Destes acidentes, 75% resultaram em perda de controle (Loss Of Control – LOC) e 25% envolveram voo controlado até o terreno (Controlled Flight Into Terrain – CFIT)  ou colisão com obstáculos.

Mais da metade de todos acidentes que revisei envolveram operação em voo visual (VFR) em condições de voo por instrumento (IMC), e um terço deles envolveram uma falha em se preparar para o voo com uma adequada revisão da meteorologia. Mais de um terço dos pilotos não tinham CHT para voo por instrumentos. Outros fatores relacionados com a meteorologia, como formação de gelo (12%), trovoadas (10%), e turbulência (6%) eram observáveis, mas não em quantidades significativas. A maior área de preocupação eram os 29% dos acidentes envolvendo falha em seguir os procedimentos IFR e as instruções do controle de tráfego aéreo. As percentagens não somam 100% dado que mais de um fator pode estar envolvido em cada acidente.

O Diabo está nos detalhes

Embora tome tempo consultar mais de 200 relatórios do NTSB ( há alguns acidentes que tiveram causas mecânicas e precisaram ser excluídos), fazer isto lhe dá uma ótima ideia de como esses acidentes estão acontecendo. Como mencionei antes, uma tendência notável em décadas anteriores era de um surpreendente número de pilotos sem habilitação por instrumentos preenchendo e voando planos de voo IFR, e acabando como estatística de acidente. Até o fim do século, estes acidentes tinham praticamente desaparecido. A falha em se consultar uma boa previsão meteorológica é mais difícil de se detectar com o aumento dos novos meios de acesso, muitos dos quais não registram estas consultas. Porém, em muitos casos foi possível determinar através de conversas com amigos, familiares e circunstantes, ou por outras ações, que o piloto estava ciente da meteorologia. Assim, o mencionado um terço daqueles acidentes envolvendo falha em se preparar adequadamente para o voo inclui apenas aqueles que realmente desconsideraram a necessidade de consultar a meteorologia, significando que não há nenhum registro ou outra evidência de que tomaram conhecimento da previsão do tempo.

Falando em desconsiderar, há algo que notei nos relatórios. Parece haver uma tendência de pilotos sem qualificação IFR decolando em condições IMC sem plano de voo, apesar de outros pilotos, amigos, familiares ou funcionários do aeroporto recomendarem enfaticamente que não o fizessem. Nestes casos, sabemos que o piloto estava bem ciente dos riscos. Em um caso que envolveu um avião que tinha vários proprietários, um dos proprietários, sem qualificação para voo por instrumentos, pediu conselho a um outro proprietário que tinha CHT de IFR quanto ao voo. O proprietário que era qualificado para voo por instrumentos revisou o planejamento e a meteorologia e disse que aquele voo não poderia ser conduzido em regras de voo visual. Infelizmente, ele estava certo e o outro piloto acabou se acidentando.

Em outro caso, um técnico em manutenção aeronáutica que tinha recém completado reparos na aeronave recomendou enfaticamente ao piloto que deixasse para decolar mais tarde, dado que o aeródromo estava em condições IMC. O piloto declinou do conselho e desapareceu nas nuvens logo após a decolagem, com resultados fatais poucos minutos depois. Estes não são casos onde havia uma chance de se permanecer abaixo das nuvens ou de se confundir quanto às condições. Não fui a fundo o bastante para quantificar se se trata de alguns pontos fora da curva com aparência de tendência ou outra coisa completamente diferente, mas estarei examinando melhor no futuro.

Na dúvida

Então, como resolver estes problemas? A primeira ação corretiva seria aprimorar sua habilidade em analisar a informação meteorológica. Revise o checklist desenvolvido por Jeff Arnold no artigo “Building Confidence with the Conditions” (“Aumentando a Confiança com as Condições”) para mais informação sobre como se informar da meteorologia.

Mas em termos mais gerais, você precisa enfatizar o uso da previsão do tempo e fazer dela mais do que apenas um ritual pré-voo. Embora possam haver exceções, a grande maioria das situações de mau tempo que se provaram fatais em muitos casos constavam das previsões meteorológicas antes da decolagem. Um passo que pode ajudar é criar um diário meteorológico. Este é um método de se registrar o conteúdo da sua previsão meteorológica em um formato fácil de consultar. Ao dividir a condição de tempo em categorias, você se força a considerá-la com mais atenção do que se você apenas ler as informações. Você também estará criando um registro das condições que você julgou aceitáveis para decolar, para ter algo para comparar se você depois encontrar condições imprevistas. Outra solução é usar de várias fontes para sua tomada de decisão.

É crucial planejar o voo em condições meteorológicas desfavoráveis com o respeito que ele merece, porque quando as coisas saem errado, ele pode facilmente se tornar fatal .

Com o advento das comunicações eletrônicas, basta algumas teclas para enviar a meteorologia de seu plano de voo para um colega revisar. Idealmente, este deveria ser um mentor, mais experiente do que você, mas qualquer outro piloto tem a vantagem de não ter interesse pessoal em fazer o voo. A síndrome do “tenho que chegar”, especialmente quando combinada com a ilusão do fundo perdido (“já paguei o hotel/as férias”), faz um estrago e tanto na nossa capacidade de tomar decisões corretas. É difícil vencê-la mesmo estando ciente dela. O uso de um conselheiro neutro, que não tem investimento na situação, é um excelente cheque de realidade. Outro grande benefício de se usar um diário de meteorologia é ter a memória de que decisões de ir/não ir são processos continuados que podem ser revertidos ou alterados se as circunstâncias mudarem. Embora um diário meteorológico seja uma excelente ferramenta para tomada de decisões, ele não é necessário para que você reavalie sua decisão. Se você sentir que as coisas não estão correndo como planejado, peça ajuda e faça um 180.

Outra área preocupante é a de processos e procedimentos por instrumentos. A falha em seguir estes procedimentos críticos tem algumas poucas causas diferentes, mas primariamente se resumem a uma falta de proficiência em voo por instrumentos e a saturação de tarefas quando em IMC. A solução ideal para estes problemas é praticar mais voo IFR em condições IMC reais com um instrutor. Porém, tanto o custo disso como as considerações práticas, como conseguir agendá-lo no mau tempo, faz disso um desafio.

Sempre advoguei pela simulação de voo como uma ferramenta adicional para esta situação. Seja em um ambiente formal, como em uma escola de voo, ou mesmo em casa no seu computador, a possibilidade de praticar procedimentos em um ambiente IMC sem risco é uma grande vantagem. Há até mesmo serviços que usam controladores de tráfego aéreo para guiar você no simulador, como se você estivesse em um ambiente real de espaço aéreo controlado. Isto lhe dá a chance de praticar procedimentos e descobrir fraquezas na sua proficiência IFR que você poderá depois sanar como um instrutor. Também é uma excelente chance para melhorar sua proficiência em fonia e se sentir mais confortável em trabalhar com controladores.

É crucial considerar o voo em condições meteorológicas desfavoráveis com o respeito que ele merece, porque quando as coisas saem errado, elas podem facilmente se tornarem fatais. Mas também porque muitos destes acidentes seriam facilmente evitados. Mantenha o foco em saber as condições que lhe esperam, as capacidades de sua aeronave e as suas próprias. Evite pensar na decisão ir/não ir como um ponto fixo no tempo. Você sempre pode mudar de ideia se as coisas não estão saindo conforme planejadas.

Jogar pode ser um passatempo divertido em um cassino, mas você não deveria jogar em um avião quando as probabilidades estão contra você. Ao invés disso, faça sua própria sorte e mantenha as chances ao seu favor seguindo as recomendações acima.

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